Human-Centered Design: falhas no processo de Design Centrado no Usuário

Embora o processo de Design Centrado no Usuário (DCU) tenha contribuído muito para o desenvolvimento de produtos na última década, nesta postagem destacaremos suas principais falhas e apresentaremos uma abordagem alternativa para os Designers.

Falhas no processo de Design Centrado no Usuário

Examinaremos duas falhas presentes no processo de Design Centrado no Usuário:

1 – O DESIGN CENTRADO NO USUÁRIO SUBVALORIZA CONHECIMENTOS PRÉVIOS

O processo de DCU enfatiza excessivamente o papel do Designer na inovação, priorizando a geração de ideias em vez de aproveitar o trabalho existente.

Trata-se de uma fase em que a equipe utiliza Notas Adesivas (“Post-Its”) para criar novas propostas para questões do tipo “Como poderíamos?”. Implicitamente, isso sugere que o problema é inédito e que as soluções atuais falharam a ponto de não haver qualquer aprendizado com elas. Assume-se, então, que é necessário explorar a criatividade da equipe para tramar uma solução personalizada.

Este não é um Design Centrado no Usuário, mas sim, em si mesmo.

É por essa razão que nem sempre o Designer pode confiar na sua intuição.

Iniciando a idealização do zero, o processo de DCU supõe que a intuição do Designer é mais valiosa do que a experiência de todos os outros profissionais anteriores. Esporadicamente isso pode ser verdade, mas a Economia Comportamental revela que muitas vezes os instintos não estão corretos.

A intuição se forma por meio de experiências repetidas ao longo do tempo, com as quais aprendemos o que é e o que não é eficaz. Pense num jogador de beisebol, rebatendo centenas de bolas em curtos intervalos de tempo. Ele ajusta seu comportamento com base em ciclos de feedback rápidos. Já os Designers não contam com essa vantagem: lançam 1 ou 2 novos produtos por ano, sendo que cada solução desenvolvida é geralmente muito diferente das outras ou, no mínimo, apresenta restrições e aleatoriedades variadas.

O fracasso do lançamento de um novo produto pode estar relacionado ao momento, ao canal de vendas, à landing page ou a outra variável desconhecida.

Desenvolver intuição torna-se um grande desafio em ambientes com ciclos de feedback prolongados, especialmente quando há ruídos e aleatoriedades envolvidos.

Certamente, a intuição pode ser uma ferramenta útil e confiável para os especialistas, propiciando insights de sucesso. Contudo, esperar que essa expertise de toda uma vida seja expressa durante um exercício em grupo com Post-Its não é o ideal.

2 – O DESIGN CENTRADO NO USUÁRIO DEPENDE DE UMA FONTE NÃO CONFIÁVEL: PESSOAS

Suponha que, entrevistando potenciais usuários, o Designer pergunte o que consideram mais importante ao escolherem uma solução: poupar tempo, economizar dinheiro ou preservar o meio ambiente. Essa é uma questão imprescindível. Caso ele consiga aprofundar essa compreensão, terá melhores condições de projetar uma solução que atenda de maneira otimizada às necessidades dos usuários e priorizar efetivamente seu planejamento.

O problema é que há vezes em que os usuários “mentem” para o Designer.

Apesar de ninguém afirmar que fará tudo o que os outros estão fazendo, é o que realmente acontece. Vários estudos identificam as normas sociais como o principal impulsionador do comportamento, superando as crenças e preferências declaradas do indivíduo.

Considere o estudo de Nisbett e Wilson, no qual as pessoas foram solicitadas a escolher sua camisola preferida dentre quatro opções diferentes. Mesmo que a ordem das camisolas tenha sido aleatória, a maioria optou por aquela localizada no extremo direito. Ao serem questionados sobre o motivo, os participantes apresentaram respostas criativas, mas ninguém disse “porque era a última à direita”. Esse é um exemplo de Efeito de Ordem.

Em sistemas como esse, em que as pessoas não estão cientes de suas preferências, o Designer não pode depender das contribuições delas nem das suas próprias intuições sobre quais soluções serão ótimas.

Os humanos não admitem quando não sabem

Décadas de estudos em psicologia revelam que grande parte do comportamento humano é conduzido por processos mentais fora da nossa consciência, ou seja, não temos pleno conhecimento do que ocorre em nosso cérebro, da nossa suscetibilidade a vieses e de como tomamos decisões.

Dessa forma, levando em conta que geralmente não estamos cientes de nossos processos de tomada de decisão, poderíamos supor que perguntas sobre esse tema deveriam ser respondidas com declarações do tipo “Não sei” ou “Não tenho certeza”. Contudo, o que acontece é exatamente o contrário: pesquisas evidenciam que as pessoas não só evitam demonstrar incerteza, como também confiam em suas respostas incorretas – muito por desconhecerem o impacto do ambiente nas suas decisões.

Sendo assim, as perspectivas não são favoráveis para abordagens tradicionais de estudo do comportamento humano. Quando questionadas sobre por que fizeram algo, ao que parece, as pessoas involuntariamente criam histórias e justificativas. E talvez o mais preocupante para os pesquisadores é que elas têm confiança nas narrativas inventadas.

Então, como o Designer pode desenvolver novos produtos e recursos, se está iniciando do zero, e o método tradicional de perguntar aos usuários para obter informações frequentemente o leva a conclusões equivocadas?

Existe uma alternativa mais científica ao Pensamento do Design (“Design Thinking”), na qual não é necessário começar do zero: o Design Comportamental.

O processo de Design Comportamental orienta as equipes a apresentarem ideias que incorporem conceitos anteriores de alta qualidade. Além disso, prioriza não o que os usuários afirmam que farão, mas suas ações efetivas.

O Processo de Design Comportamental

Na maioria das vezes, outras pessoas já tentaram solucionar o mesmo problema que o Designer está investigando e documentaram suas abordagens em artigos acadêmicos ou estudos de caso, com uma análise minuciosa dos resultados obtidos.

Por essa razão, um dos pontos de partida na resolução de problemas em Ciência Comportamental é revisar a literatura acadêmica para obter hipóteses sobre como abordar uma situação específica (ou aprimorar a intuição quanto ao desempenho de determinadas soluções).

Após usufruir do conhecimento já disponível, os Cientistas Comportamentais realizam um diagnóstico comportamental, que consiste em mapear todos os detalhes do cenário em questão. O objetivo é descobrir as psicologias que impulsionam as pessoas a agir ou não em certas ocasiões e compreender como se comportam na prática em comparação com o que afirmam fazer.

Utilizando essas informações fundamentais, são geradas hipóteses a respeito de como resolver um problema com base no comportamento real. Essas hipóteses podem ser submetidas a testes por meio de pesquisa quantitativa e qualitativa, proporcionando geralmente um ponto de partida robusto para o processo iterativo.

Exemplos do Processo de Design da Ciência Comportamental

A aplicação dessas estratégias no projeto de novos produtos e experiências dá início ao processo de Design da Ciência Comportamental, o que não apenas reduz consideravelmente o esforço inicial exigido pelas equipes, mas também integra pesquisas já existentes em relação a como as pessoas de fato se comportam.

E, o mais importante, é eficaz:

  • Google o adotou para elevar a retenção de anunciantes.
  • Steady dobrou suas taxas de conversão para um novo recurso.
  • Livongo o empregou para alcançar um aumento de 120% nos cadastros.

O Design Comportamental pode ser introduzido em qualquer contexto, seja para tornar um aplicativo de meditação mais envolvente, aumentar a adesão ao programa de reciclagem da cidade ou na criação de um novo produto que auxilie estudantes a economizar dinheiro.

Texto adaptado de https://irrationallabs.com/blog/human-centered-design/

Leia também