Design de Experiência e o comportamento do usuário: como projetar para criar hábitos com vieses cognitivos

Desenvolver uma experiência empática exige mergulhar completamente na vida do público-alvo. Seguindo o princípio do profissional de UX de “caminhar uma milha com os sapatos do seu usuário”, o Designer deve recorrer a entrevistas, personas, casos de uso, fluxos de usuário, mapas de jornada, grupos focais, entre outras técnicas, na tentativa de conhecer mais a fundo as pessoas que ele deseja influenciar.

Mas e quanto aos diferentes tipos de personalidade? O que realmente motiva as pessoas? O que elas de fato valorizam? Que fatores estão ocorrendo em suas vidas que podem afetar sua capacidade de se envolver em uma experiência? Todos esses são aspectos intangíveis para os quais o Designer frequentemente não possui uma forma concreta de quantificar.

A Ciência de Dados e a Análise de Dados têm muito a revelar sobre os hábitos digitais das pessoas. A interpretação desses dados pode fornecer informações sobre suas vidas. No entanto, o que acontece fora do mundo virtual e dentro de suas mentes? É neste ponto que a Ciência Comportamental pode ser importante.

A Ciência Comportamental é dedicada ao estudo do comportamento humano e da tomada de decisões, envolvendo observação direta e indireta de pessoas por meio de abordagens qualitativas e quantitativas. Com este método, é possível identificar tipos comportamentais específicos durante o processo de Design do produto.

Reconhecer Arquétipos ajuda a categorizar as pessoas em grupos maiores. Contudo, essa Ciência se destaca principalmente em situações em que um indivíduo se desvia da sua norma arquetípica. Quando as pessoas destoam dos padrões típicos de tomada de decisão, estímulos e outros motivadores podem ser implementados para impactar positivamente o seu comportamento e reintegrá-las à experiência. Essa prática é especialmente valiosa na área da saúde, onde o comportamento do paciente é fundamental para a manutenção da saúde e do bem-estar.

Apresentaremos um modelo básico para determinar o tipo de personalidade de um indivíduo.

Arquétipos

Segundo o psiquiatra e psicoterapeuta suíço Carl Jung, fundador da psicologia analítica, “Arquétipos são tendências inatas que moldam o comportamento humano, um padrão de comportamento do qual outros são copiados e emulados”.

Os Arquétipos são amplamente baseados em padrões de comportamento de usuários ou grupos de usuários. São definidos através da avaliação dos padrões de ação durante uma experiência: como e por que as pessoas compram algo, e quais são as suas motivações para agir. Aprofundando no comportamento dos usuários, o Designer enxerga e vivencia o cenário sob a perspectiva deles. Essa abordagem resulta em uma estratégia de Design mais refinada no futuro. Além disso, auxilia a marcar e medir com mais precisão as análises que serão posteriormente utilizadas para iterar na solução de Design.

É imprescindível considerar os Arquétipos. A compreensão do(s) Arquétipo(s) de uma pessoa possibilita ao Designer se colocar mais facilmente no lugar dela. Imergir no processo de aprendizado sobre os usuários para os quais está sendo feito o projeto fornece uma visão imensurável e contribui para o entendimento das preocupações e desafios deles. Assim, o Designer será capaz de projetar conhecendo as necessidades dos usuários.

Definindo Arquétipos

O processo inicial para determinar o Arquétipo de uma pessoa envolve uma série de entrevistas com usuários, nas quais são feitas diversas perguntas. Posteriormente, durante a configuração do perfil e por toda a experiência do produto, à medida que os usuários o utilizam ao longo do tempo, são realizadas mais perguntas. Esse ciclo de questionamentos busca obter informações sobre os interesses dos usuários, suas motivações e o que valorizam.

Definir aspectos da vida “offline” dos usuários que influenciam suas decisões ajuda a identificar seu modelo mental (“mindset”). Por exemplo, eles possuem dívidas? Estão passando por mudanças em seus relacionamentos? Essas questões impactam as pessoas de várias formas. Informações da vida real são comumente aplicadas em soluções de cuidados de saúde, mas também são úteis em produtos de consumo e em outras situações online baseadas em hábitos.

Na Análise de Dados, observar os locais que as pessoas visitam na internet (seus hábitos de compras e padrões sociais) também pode propiciar um panorama do seu mundo. Esses dados ganham mais valor conforme são coletados e interpretados durante longos períodos de tempo. Os padrões mudam lentamente com o passar do tempo e, quantificando a atividade e a progressão dos usuários com base nessa perspectiva, o Designer começa a reunir uma história e uma visão mais abrangente da vida deles.

A partir das informações coletadas, é possível definir Arquétipos de várias maneiras distintas. Alguns usuários podem demonstrar competitividade, enquanto outros podem ter uma mentalidade mais de rebanho. Alguns podem ser individualistas, enquanto outros são mais altruístas, sempre prontos para ajudar quem precisa.

Os Arquétipos são melhores que as Personas?

Personas são excelentes para definir um público geral e seus membros, porém focam principalmente nos fatos e características de uma pessoa, deixando em segundo plano sua forma de pensar. Elas determinam com quem o Designer está lidando. Por outro lado, os Arquétipos exploram mais detalhadamente os padrões comportamentais das pessoas. E, ainda mais importante, destacam os fatores que podem desencadear uma reação adversa, como será discutido mais adiante neste artigo.

Vieses Cognitivos afetando os Arquétipos

Quando ao longo do tempo as pessoas se afastam do que normalmente é considerado sua norma comportamental, na maioria das vezes isso se deve a algum tipo de Viés Cognitivo. Há centenas de Vieses Cognitivos diferentes que foram amplamente estudados na área da Psicologia humana.

Em relação ao Design voltado para o comportamento do usuário, a tendência é a presunção de que as condições permanecerão inalteradas. Essa suposição é arriscada, pois não considerar a possibilidade de mudanças e o impacto dos Vieses pode rapidamente fazer com que o usuário perca qualquer motivação para continuar com a experiência.

Vinculando Arquétipos aos Vieses Cognitivos dos usuários, o Designer ganha clareza ao criar uma matriz de conteúdo estratégico. A matriz apontaria maneiras de responder aos desvios da norma no comportamento dos usuários. A seguir, examinaremos alguns dos principais Vieses abordados no Design Comportamental.

Viés do Status Quo

Ter o Viés do Status Quo geralmente indica uma grande resistência a mudanças. Pessoas com essa tendência precisam de uma forte motivação para experimentar algo novo. Elas não são as primeiras a adotar produtos novos. Projetar levando em consideração o Viés do Status Quo envolve estabelecer metas incrementais lentas por um longo período de tempo.

Aversão à Perda

Como o próprio nome sugere, Aversão à Perda é a tendência de temer perder algo ou não obter o suficiente com o tempo. Esse viés é frequentemente explorado pelo marketing para induzir as pessoas a comprarem um produto imediatamente. Projetar mirando a Aversão à Perda implica destacar o que será perdido se a ação não for imediata.

Exemplo: “É melhor você comprar suas passagens aéreas agora, pois restam apenas 3 lugares!”.

Efeito Bandwagon ou Mentalidade de Rebanho

Efeito Bandwagon, também conhecido com Mentalidade de Rebanho, é a tendência de adotar determinados comportamentos ou crenças apenas porque muitas outras pessoas fazem a mesma coisa. É a propensão a querer fazer parte de um grupo. Projetar considerando esse Viés significa evidenciar o que outras pessoas estão fazendo no site no momento.

Exemplo: Um site de viagens exibe em uma das suas páginas a frase “40 pessoas estão buscando reservar um quarto neste hotel”. Essa é uma técnica de marketing destinada a fazer com que as pessoas sintam que serão deixadas de fora do grupo se não comprarem imediatamente. Em muitos casos, também tem relação com a Aversão à Perda.

Heurística da Disponibilidade

A Heurística da Disponibilidade refere-se à avaliação ou decisão rápida sobre algo (ou alguém) com base na opinião atual. É a tendência de fazer suposições. Projetar de acordo com esse Viés consiste em assegurar que os usuários não presumam conhecer as informações conforme avançam na jornada. Também está associado à ideia de que, quando se ouve algo repetido por muito tempo e com frequência suficiente, deve ser verdade.

Desconto Hiperbólico

Pense na compra por impulso, obtendo um benefício imediato com um desconto. O Desconto Hiperbólico leva a escolhas que são inconsistentes ao longo do tempo: as pessoas decidem por algo hoje que o seu “eu” futuro preferiria ter evitado, apesar de utilizarem o mesmo raciocínio.

Por exemplo, suponha que uma pessoa esteja comprando flores pela internet. Na etapa final, são oferecidos produtos adicionais como chocolates e ursos de pelúcia, todos com desconto, mas somente se adquiridos imediatamente. É difícil prever se ela optará por comprar os itens extras ou não. Fatores como seu estado de espírito naquele dia, o motivo (positivo ou negativo) para comprar as flores e seu saldo bancário influenciam na decisão de adicioná-los ou não. Projetar levando em conta esse Viés implica incorporar ao Design um recurso conhecido como “FOMO” ou “medo de perder algo” caso a ação não seja imediata.

Existem centenas de Vieses diferentes. Apresentamos aqui somente alguns dos mais comuns aplicados ​​​​em Design. Cabe ao Designer identificar um grupo deles que atendam às necessidades específicas do seu projeto.

Lista de vieses cognitivos que podem ser aplicados ao UX Design

Conclusão

Ao tomar a Ciência Comportamental como base para o seu Design, definindo o arquétipo de uma pessoa e compreendendo estrategicamente como aplicar os Viés Cognitivos, o Designer pode moldar com mais precisão experiências interativas que personalizam o conteúdo de forma dinâmica. Aprender sobre as pessoas, seus comportamentos e ocorrências de vieses ao longo do tempo lhe permite adaptar gradualmente a experiência do produto para manter os usuários motivados. Quando esses esforços são combinados com a Análise de Dados e a Ciência de Dados, tornam-se ferramentas poderosas para influenciar positivamente o comportamento humano.

Texto adaptado de https://www.toptal.com/designers/ux/designing-for-human-behavior

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