Viés cognitivo no UX Design: como enviesar usuários para criar melhores experiências?

Há tempos pesquisadores se dedicam a desenvolver métodos que buscam minimizar o impacto negativo dos vieses cognitivos na coleta de dados (em projetos de design, por exemplo). Entretanto, costumeiramente Designers e Pesquisadores de Experiência (UX Researches) se expõem a erros sistemáticos por não aplicarem as melhores práticas.

Aqui, abordaremos três vieses cognitivos pouco lembrados e maneiras de atenuá-los.

Tomamos milhares de decisões todos os dias — como dito por Rian Dutra em seu livro Enviesados —, sendo a maioria delas inconscientes, pois o cérebro utiliza atalhos mentais (heurísticas), que podem levar ou não a resultados favoráveis.

O alento é que os vieses cognitivos são previsíveis e sistemáticos, ou seja, é possível por parte dos profissionais identificar esses vieses e contornar cada situação.

1. Viés da Maldição do Conhecimento

É um viés cognitivo que faz as pessoas presumirem que outras têm o mesmo grau de conhecimento sobre algum assunto, tanto quando elas.

Mesmo que muitos UX Designers e UX Researches falem sobre a importância de ter “empatia” em projetos e pesquisas de design, estudos mostram como é difícil assumir a perspectiva de outra pessoa quando se tem um certo conhecimento sobre algo.

Esse viés pode causar problemas de UX (“Experiência do Usuário”, ou “User Experience”), como baixa capacidade de descoberta de funções ou informações importantes do site, fluxos de integração não intuitivos e uma curva de aprendizado íngreme da funcionalidade de um sistema.

Podemos usar os métodos a seguir a fim de evitar que usuários e empresas sejam afetados negativamente por tal viés:

a) Pratique a tomada de perspectiva, além da empatia

Na pesquisa de UX, a empatia tem o intuito de considerar as necessidades e motivações dos clientes em relação a produtos ou serviços.

O conceito de tomada de perspectiva é semelhante: colocar-se no lugar de outra pessoa. No entanto, a ênfase aqui está em considerar como os outros, com suas capacidades cognitivas únicas em contextos específicos, enxergam o mundo.

Falhas na tomada de perspectiva são comuns no uso Diário de produtos e serviços (método comumente utilizado). Para os designers, além de fornecer uma solução geral para as necessidades dos usuários, é necessário considerar o seu estado cognitivo no contexto de uso.

Considere utilizar um passo a passo cognitivo e um estudo de usabilidade. Reúna participantes com o mesmo nível de familiaridade que seus usuários em um cenário de pesquisa com condições similares às reais. Meça o comportamento de usuários reais com análises ou testes de usabilidade.

Um investimento em pesquisas que ajudem a entender as perspectivas dos humanos pode trazer economias de recursos no futuro e aumentar a confiança na tomada de decisões baseada em dados.

b) Invista em capacidade de aprendizado

Estudos indicam que seres humanos tendem a guardar uma memória mais forte do início de uma experiência (Efeito Primazia). E, quando assume-se que os usuários não precisam de uma maior atenção nessa etapa inicial, isso pode levá-los a terem uma primeira impressão não tão boa assim.

Pode-se medir o impacto da experiência inicial na adoção e retenção do produto a longo prazo para se descobrir o quão necessária é uma ajuda aos clientes. Se for notado um baixo desempenho, otimizações devem ser feitas com o intuito de reverter tal quadro.

2. Efeito Auréola (Halo) e Efeito Chifre

Quando a impressão geral de um produto ou serviço é moldada por uma impressão positiva em um dos seus aspectos temos o Efeito Auréola (Halo). Porém, pode acontecer o oposto: quando a influência se dá por uma experiência negativa em um dos aspectos, pode acontecer o Efeito Chifre.

Em particular, os Efeitos de Auréola e Chifre podem distorcer a interpretação dos dados de “Voz do Cliente”. Comentários como “Nunca mais comprarei nessa empresa horrorosa” tem uma forte valência negativa, podendo levar um Analista de Experiência a interpretar outros comentários como mais negativos do que realmente são e apresentar conclusões distorcidas. De maneira análoga, também pode ocorrer com comentários positivos.

Garantir uma amostra suficientemente grande para compensar comentários extremos pode não ser tão simples na prática. Portanto, outras medidas devem ser tomadas:

a) Crie uma taxonomia

Uma taxonomia é um sistema acordado para classificar as respostas do usuário em categorias predeterminadas, como motivação do usuário, facilidade de uso e pontos problemáticos. A classificação deve ser consistente e feita por membros treinados da equipe de design e pesquisa.

Com os dados dos usuários codificados e comparados, os UX Researches (Pesquisadores de Experiência do Usuário) podem iniciar uma análise, procurando padrões abrangentes para relatar insights às partes interessadas de forma não tendenciosa.

b) Use Processamento de Linguagem Natural (PLN)

PLN refere-se ao uso de algoritmos para classificar as respostas dos usuários. É semelhante à taxonomia de marcação manual, porém com os benefícios adicionais de automação, velocidade, consistência e confiabilidade.

c) Apresentações das partes interessadas e relatórios sem viés

Os pesquisadores que apresentam análises de dados dos clientes normalmente incluem citações do usuário para aumentar a empatia. Entretanto, devem enfatizar que esses são exemplos de tendências abrangentes, pois citações isoladas podem desencadear os efeitos Halo e Chifre, influenciando o público.

3. Efeito Dunning Kruger

Esse é um viés cognitivo no qual os humanos superestimam seu nível de conhecimento ou habilidades em algo. Como exemplo, podemos citar os profissionais de design superestimarem seu conhecimento sobre necessidades e objetivos dos usuários, o que pode acarretar padrões problemáticos, e direcionar o negócio para um caminho incorreto.

Consequentemente, o efeito Dunning Kruger pode levar as empresas a implementar iniciativas que não gerem o retorno esperado.

Sendo assim, é importante ser capaz de se ajustar rapidamente às demandas em constante mudança tendo em mente que, muito provavelmente, sabemos menos sobre os clientes do que pensamos.

Sendo assim, dois métodos podem ser utilizados para reduzir o efeito Dunning Kruger:

a) Workshop de conhecidos-desconhecidos

Durante a apresentação à equipe (workshop), proponha uma classificação envolvendo quatro grupos, com o intuito de descobrir o que realmente se sabe sobre as necessidades do usuário e o que são apenas suposições, conforme explicado abaixo:

  • Conhecidos-conhecidos: são fatos baseados em evidências sobre os usuários. É fundamental que as evidências que sustentam cada afirmação também sejam citadas.
  • Conhecidos-desconhecidos: referem-se a perguntas e suposições sobre clientes que precisam ser confirmadas.
  • Desconhecidos-conhecidos: são alegações como “acho que já foi feito uma pesquisa sobre isso, mas não tenho certeza”.
  • Desconhecidos-desconhecidos: referem-se a informações potencialmente inesperadas sobre as quais a equipe não tem hipóteses.

b) Pesquisa “Um dia na vida” (ou “no cotidiano”)

Tem o intuito de entender a realidade cotidiana das pessoas que utilizam o produto ou serviço (ex: site ou aplicativo), podendo ser feita de forma presencial ou online.

A maneira tradicional de realizar esse estudo é acompanhar os usuários em seu ambiente natural, observando suas rotinas para entender como o produto/serviço pode atender às suas necessidades. Dependendo da forma como for conduzida, pode se enquadrar como um tipo de Pesquisa ou Investigação Contextual.

Conclusão

Uma das melhores maneiras de se proteger contra os vieses cognitivos na coleta e interpretação de dados é a triangulação da pesquisa, a qual consiste em utilizar mais de uma abordagem para responder a uma pergunta. Se os resultados de todos os métodos indicarem uma mesma conclusão, é provável que estejam descrevendo a realidade dos usuários, verdadeiramente.

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